Ontem deu-se a transladação do corpo de Sophia de Mello Breyner Andresen, do Cemitério de Carnide para o Panteão Nacional, em Lisboa.
Em Fevereiro passado a Assembleia da República decidiu por unanimidade dar honras de Panteão Nacional à escritora.
A arca tumular da poetisa e contista encontra-se na mesma sala do general Humberto Delgado e do escritor Aquilino Ribeiro.
Fundo do Mar
No fundo do mar há brancos pavores,
Onde as plantas são animais
E os animais são flores.
Mundo silencioso que não atinge
A agitação das ondas.
Abrem-se rindo conchas redondas,
Baloiça o cavalo-marinho.
Um polvo avança
No desalinho
Dos seus mil braços
Uma flor dança,
Sem ruído vibram os espaços.
Sobre a areia o tempo poisa
Leve como um lenço.
Mas por mais bela que seja cada coisa
Tem um monstro em si suspenso
(Em Obra Poética, Caminho)
Sophia de Mello Breyner Andresen, nascida a 6 de Novembro de 1919 no Porto, e falecida a 2 de Julho de 2004 em Lisboa, foi uma das poetizas portuguesas mais importantes do século XX. Foi a primeira mulher a receber o Prémio de Camões, em 1999, sendo este o galardão literário mais importante da língua portuguesa. Também foi distinguida com o Prémio Rainha Sofia, em 2003.
Filha de Maria Amélia de Mello Breyner e de João Henrique Andresen, cresceu no meio da velha aristocracia portuguesa e foi educada nos valores tradicionais da moral cristã, tendo vindo a tornar-se dirigente dos movimentos universitários católicos quando frequentava Filologia Clássica na Universidade de Lisboa (1936-39), curso que nunca veio a concluir.
Colaborou na revista Cadernos de Poesia e tornou-se uma das figuras mais representativas de uma atitude política liberal que apoiava o movimento monárquico e denunciava o regime salazarista e os seus seguidores.
Casou-se em 1946 com Francisco Sousa Tavares e foi mãe de cinco filhos.
Em 1964 a Sociedade Portuguesa de Escritores atribuiu-lhe o Prémio de Poesia pelo seu livro "Livro Sexto", mas a escritora veio igualmente a tornar-se conhecida pelo seu trabalho como contista "Contos Exemplares" e livros infantis como "A Menina do Mar", "O Cavaleiro da Dinamarca", "A Floresta", "O Rapaz de Bronze", "A Fada Oriana". Membro da Academia das Ciências de Lisboa, também trabalhou na tradução das obras de Dante Alighieri e Shakespeare.
Morreu aos 84 anos no Hospital da Cruz Vermelha, a 2 de Julho de 2004.
De uma forma geral, a sua obra era representada pelos seguintes pontos:
- Pela procura da justiça, do equilíbrio, da harmonia e da exigência moral;
- Pela tomada de consciência do tempo em que se vive;
- Da Natureza e o Mar como espaços eufóricos e referenciais para qualquer ser humano;
- Da casa como tema;
- Do amor;
- Da vida em oposição à morte;
- Pela memória da infância;
- Dos valores da Antiguidade Clássica e do Naturalismo Helénico;
- O poeta como representante do absoluto;
- Da crença em valores messiânicos e sebastianistas;
- Pela separação.
A hora da Partida
A hora da partida soa quando
Escurecem o jardim e o vento passa,
Estala o chão e as portas batem, quando
A noite cada nó em si deslaça
A hora da partida soa quando
As árvores parecem inspiradas
Como se tudo nelas germinasse.
Soa quando no fundo dos espelhos
Me é estranha e longínqua a minha face
E de mim se desprende a minha vida.
Fontes: Lusa, Wikipédia, Poesias_e_Prosas